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Machos,Brancos e Mortos.E Todos os Outros é Claro.(Sobre a Vida e a Obra de...)

Postado em 06/02/2015

MFK FISHER


 Ela não é apenas um rostinho bonito apesar de que em princípio nos sintamos tentados pelo seu longo pescoço e o colo como os das musas de Botticelli.Mary Francis Kennedy Fisher (1908-1992) é uma das maiores vítimas do conhecido paradoxo (quase axioma):"Clássico é um livro de que todos falam mas que ninguém leu."
 No final das contas ela é mais conhecida pelos fãs do Pica-Pau que faz várias referências ao seu primeiro e pelo menos aqui no Brasil o mais célebre dos seus tão pouco afamados livros "Como Cozinhar um Lobo":Como Matar a Fome em Tempos de Escassez (How to Cook a Wolf.1942).

Un Connaisseur...
 Nessa pequena grande obra ela mostra de forma muito didática o sentido de toda a técnica que os fritadores de ovos tem como frívolas e traz à tona todo o refinamento dos grandes mestres como Brillat-Savarin entre outros e tudo numa época em que açúcar ou manteiga podiam ser tidos quase como um luxo afinal o mundo estava em plena guerra e muitos talvez achassem mais usual a dieta proposta pelo distópico 1984 de George Orwell.


 Vamos então aproveitar a oportunidade para aguçar os nossos sentidos com uma pequena porção desta preciosidade.Tanta gente merecia ter ganho o Nobel e não foi agraciada mas na minha opinião ela e o grande mestre da psicologia Bruno Bettelheim são duplamente injustiçados pois alcançaram o respeito do público e deram mostras de grande virtuosismo em seus trabalhos.Mas enfim (citamos aqui a edição da Companhia das Letras):

 "Água é água,o dicionário diz,quando é um líquido incolor,inodoro e transparente,consistindo em dois volumes de hidrogênio para um de oxigênio.Pode também ser chuva,mar,ou um brilho de diamantes.A água a que me refiro,porém,é clara e boa água que sai de uma torneira ou,se você tem sorte,de um poço ou de uma fonte.É a melhor para cozinhar lobos."

  "O que os chefs diriam agora,se pudessem,jamais saberemos.Os moços e moças que comiam bifes grelhados em suas roupas esportivas no Café de Paris são um segredo tão grande quanto o próprio Café de Paris.Fantasmas dos grandes restaurantes e seus cozinheiros podem reclamar que a falta de espírito e finesse traiu o velho tanto quanto o não nascido;fantasmas dos jovens podem responder que riqueza e sutileza não passavam de fosforescência sobre a cultura decadente que Carême e Vatel e todos os outros mestres lhes legaram."

  E claro uma das suas famosas receitas:

  Omelete Francesa Básica:

  6 ovos
  3 colheres de manteiga
  sal e pimenta-do-reino

  Assegure-se de que a frigideira (20 ou 25 cm) está lisa por dentro.Aqueça a manteiga nela até exalar um cheiro de nozes,mas sem dourar. ("Isso não só dará um ótimo gosto,como o grau de calor atingido para produzir o aroma garantirá o cenário perfeito para os ovos",diz Escoffier.)Gire a frigideira para que a manteiga cubra as laterais.
  Bata os ovos levemente com um garfo,adicione os temperos e despeje na frigideira.Assim que as bordas estiverem definidas,passe uma espátula sob o centro de tal maneira que todas as partes não cozidas escorram para baixo da já cozida. [Agora eu já sei,fatalisticamente,que se estou usando uma frigideira que conheço e se passei a quantidade certa de manteiga em torno dela,e se as estrelas,os ventos e o clima emocional em geral estiverem em conjunção e harmonia,posso fazer uma omelete perfeita sem encostar uma espátula nela.Ocasiões assim são históricas,bem como acidentais.]Faça isso uma ou duas vezes,nunca deixando-a fazer o que ela quiser.Quando estiver delicadamente dourada embaixo e cremosa em cima,dobre-a pelo meio (ou enrole-a,se é mestra),escorregue-a para um prato e sirva rápido.
  Ervas picadas,queijo,cogumelos e quase qualquer outra coisa podem ser adicionados conforme sua vontade,seja antes,nos ovos mexidos,seja quando ela estiver pronta para ser dobrada.[Peixe ou ave delicadamente cremosos,generosos em proporção ao tamanho de cada omelete,podem ser misturados aos poucos à omelete,ou ervilhas frescas ou aspargos,levemente cozidos na manteiga.]

  Dá até vontade de puxar um banquinho.

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